
Os sentimentos atrasam,
as paixões atrasam,
as instituições atrasam,
está tudo a mais, nesse demais sempre a
pesar sobre a existência, ela própria uma ideia
a mais,
filósofos, sábios, médicos, padres, pouco a
pouco de mansinho e brutalmente, têm-nos
feito esta vida falsa
porque não há profundidade nas coisas,
não há além, nem mais voragem do que a que
formos capazes de lá pôr
já,
sem ideia nem entidade,
sem imanência nem instância,
nada me espera para me pedir contas,
mas eu tenho contas a pedir a alguns ignóbeis
velhos labregos da doutrina,
contas a pedir por retardarem a vida
com os seus sentimentos, paixões, instituições.(...)
Antonin Artaud, os sentimentos atrasam, 1956