sexta-feira, fevereiro 23, 2007


















"Curioso é que nós passamos 40 ou 50 anos de uma vida a fazer determinadas coisas e um dia mais ou menos de repente, sem que renunciemos a nada do que fizemos, apercebemo-nos de que tudo deveria ter sido diferente. É apenas uma vaga sensação que se instala, sem que saibamos defini-la muito bem. No fundo sou muito mais contraditório e supersticioso do que quis admitir ao longo dos anos."
"Eu sempre disse que a música é comprometida quando o músico, como cidadão é um homem comprometido. Não é o produto saído desse cantor que define o compromisso mas o conjunto de circunstâncias que o envolve com o momento histórico e político que se vive e as pessoas com quem ele priva e com quem ele canta.
"Não me arrependo de nada do que fiz. Mais: eu sou aquilo que fiz. Embora com reservas acreditava o suficiente no que estava a fazer, e isso é o que fica. Quando as pessoas param há como que um pacto implícito com o inimigo, tanto no campo político como no campo estético e cultural. E, por vezes, o inimigo somos nós próprios, a nossa própria consciência e os alibis de que nos servimos para justificar a modorra e o abandono dos campos de luta."
" Admito que a revolução seja uma utopia, mas no meu dia a dia procuro comportar-me como se ela fosse tangível. Continuo a pensar que devemos lutar onde exista opressão, seja a que nível for."

José Afonso













JOSÉ AFONSO 1929 - 1987

Utopia

Cidade
Sem muros nem ameias
Gente igual por dentro
gente igual por fora
Onde a folha da palma
afaga a cantaria
Cidade do homem
Não do lobo mas irmão
Capital da alegria

Braço que dormes
nos braços do rio
Toma o fruto da terra
E teu a ti o deves
lança o teu
desafio

Homem que olhas nos olhos
que não negas
o sorriso a palavra forte e justa
Homem para quem
o nada disto custa
Será que existe
lá para os lados do oriente
Este rio este rumo esta gaivota
Que outro fumo deverei seguir
na minha rota?

José Afonso

quinta-feira, fevereiro 15, 2007
















Eu vivo la longe,longe
Onde passam os navios
Mas um dia hei-de voltar
As aguas dos nossos rios
Eu vivo la longe,longe...

Hei-de passar na cidade
Como o vento nas areias
E abrir todas as janelas
E abrir todas as cadeias
Eu vivo la longe,longe...

Hei-de passar a cantar
Pelas ruas da cidade
Erguendo na mao direita
A espada da liberdade
eu vivo la longe,longe...

Manuel Alegre

terça-feira, fevereiro 13, 2007



















...Ali fica o retrato destes dias
Gestos e pensamentos tudo fixo
Manhã dos outros não nossa manhã
pagão solar de uma alegria calma...

Ruy Belo, Orla Marítima

(Carrasqeira, cais palafítico)

sábado, fevereiro 10, 2007















Despenalização da IVG (II)
Aborto clandestino: um flagelo social
Assembleia da República, 20.2.97
28.12.2006


Portugal é o país da Europa onde mais abortos se praticam ilegalmente por ano, onde mais mulheres morrem por causa de abortos clandestinos e onde mais mulheres ficam mutiladas em consequência de abortos feitos em condições degradantes, sem um mínimo de higiene e de segurança. Este problema não é um problema do foro íntimo. É um flagelo social que exige uma decisão política. E essa responsabilidade é nossa, porque esta é a sede da representação nacional. Não se trata de saber quem é por ou contra o aborto. Ninguém aborta por prazer. Não se trata tão pouco de uma questão entre católicos e não católicos, crentes e não crentes. Trata-se de saber quem é por ou contra a adaptação da realidade jurídica à realidade social. Quem é por ou contra a persistência de uma proibição que está em contradição com a vida e que a vida, na prática, já revogou. Trata-se, ao fim e ao cabo, de saber quem é pela verdade na lei ou pela continuação nela da mentira e da hipocrisia. Este é que é o fundo da questão.


Manuel Alegre