sábado, dezembro 02, 2006


















Paisagem


Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.


Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores, elástica e dura.
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.


Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento,
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.


Eram os pinheirais onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa
A sua quietude, secretamente viva,
E a sua exalação afirmativa.


Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre.


Sophia de Mello Breyner Andresen

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